Vivemos em uma sociedade que nos exige produtividade constantemente. A famosa sociedade do cansaço nos faz trabalhar sem descanso, e isso se reflete até nas roupas que escolhemos. Quando pensamos nas roupas de trabalho, estamos falando de uma peça que, muitas vezes, não reflete nossa verdadeira personalidade. Ao contrário, são roupas pensadas para atender aos códigos de vestimenta exigidos pelo ambiente profissional, roupas que, em muitos casos, nos obrigam a seguir padrões de formalidade e conformidade. Investimos nelas porque elas dizem algo sobre nosso status, nosso cargo, nossa posição na sociedade.

 

Por outro lado, quando pensamos nas roupas de descanso, muitas vezes vemos algo bem diferente. Usamos roupas velhas, improvisadas, ou até roupas de academia, como se o descanso não merecesse o mesmo cuidado ou a mesma reflexão que damos ao nosso traje de trabalho. E aqui entra uma reflexão importante: a roupa de descanso deveria, na verdade, ser um reflexo da nossa verdadeira personalidade, mais do que a roupa de trabalho. Afinal, no trabalho, muitas vezes nos vestimos de acordo com um código imposto, algo que não necessariamente nos representa. Já no momento de descanso, em nossa vida pessoal, temos a liberdade de expressar quem somos.

 

É irônico, então, que a roupa que usamos para relaxar, para descontrair, seja muitas vezes tratada como algo secundário. Em uma pesquisa recente da Associação Brasileira de Psiquiatria, 32% dos trabalhadores no Brasil relataram sintomas de burnout, um problema crescente em uma sociedade que não nos permite descansar. E esse esgotamento não está apenas no trabalho, mas também nas escolhas que fazemos para nos desconectar. A roupa de descanso se tornou apenas mais um reflexo dessa pressão por produtividade.

 

Vale lembrar que o primeiro alerta sobre essa questão surgiu durante a pandemia, quando fomos obrigados a trabalhar de casa. Foi aí que muitos de nós percebemos que não tínhamos roupas confortáveis o suficiente para esse novo cenário. A distinção entre roupa de trabalho e roupa de descanso se tornou ainda mais clara, mostrando que até o momento de desconectar é permeado por expectativas de produtividade e aparência.

 

Freud, em suas análises, já destacava a importância do “olhar do outro” na construção da nossa identidade. Em uma sociedade que nos avalia constantemente, mesmo no descanso, não podemos escapar dessa pressão. Byung-Chul Han, em A Sociedade do Cansaço, nos alerta: “A falta de descanso não é só a exaustão do corpo, mas a exaustão da alma, que se torna produtiva a todo momento.”

 

Talvez seja hora de repensarmos a nossa relação com a roupa de descanso. Se o trabalho exige padrões que muitas vezes não refletem quem somos, talvez seja na hora do descanso que deveríamos nos permitir mais liberdade, mais autenticidade. A roupa que usamos para relaxar deveria ser o reflexo de nossa essência, algo que nos permita, finalmente, ser quem somos sem as imposições do mundo exterior.

 

Em um mundo que nos cobra a todo momento, quem somos quando não estamos trabalhando? A roupa de descanso deveria ser o espaço para essa resposta. Talvez, ao valorizarmos mais esse momento e as roupas que escolhemos para ele, possamos, de fato, começar a descansar e a nos reconectar com nossa verdadeira essência.

 

 

Por Vivan Lagua (vivilagua) e Amanda Ramalho do @esquizofrenoias

FOTO 🎞 Marina Nacamuli @marinanacamuli

Modelo: Marcela Maita @amarcelamaita